segunda-feira, 18 de maio de 2009

Eles

Um amigo meu contara-me que eles, assemelhando-se a outros quaisquer passageiros, chegavam à estação, lavados e bem vestidos, e metiam-se a controlar o horário dos comboios através dos painéis e através dos seus relógios de pulso.
Chegada a hora do comboio, aproximavam-se da plataforma e antes que este parasse, atiravam-se para a linha. Eram perspicazes e conseguiam sempre atingir o seu objectivo à primeira: sem hesitação nem sofrimento. Restava apenas o grande transtorno daqueles que teimavam em continuar vivos, naquela estação, à espera de embarcar.

13 comentários:

Alexandre disse...

sempre fui adepto de dar um cadáver limpo e integro a quem me há-de sepultar.

joao disse...

isto dava alta curta...

Cristina H. disse...

... ou o principio de um romance;)

Pedro Horta disse...

Faz-me lembrar um velho livrinho lá de casa chamado "200 contos de arrepiar".

Gostei.

odeusdamaquina disse...

Há 2 semanas foi uma ela que se atirou na estação da Portela de Sintra, à hora em que os alunos (e os professores) saíam das aulas e iam apanhar o comboio. Querem maior ficção que esta realidade?
Sim, eles e elas continuam a atirar-se à linha. A atirar as suas vidas a uma simples linha.
No Porto, atiravam-se da Ponte em tempo de crise. A ponte continua a ser uma passagem...para os crentes!

Cristina H. disse...

Alexandre,
Concordo plenamente: é simpático dar um cadáver limpo e integro a quem nos irá sepultar. Ou isso, ou então desaparecermos no ar e ninguém ter que levar connosco...

--------------------------

Mano,
O livro chamava-se 270 contos de arrepiar e eu, estupidamente, emprestei-o numa de tentar instruir uma amiga. Conclusão: nem instrução, nem devolução. Mea culpa, por achar q posso mudar os mundos que me rodeiam...
Obrigada por me leres e teres gostado*

________________________________

Odeusdamaquina,
O desespero por vezes leva-nos a fazer coisas idiotas. Eu prefiro enfiar-me no comboio e dar uma volta, mas ele há gostos para tudo.
Porque não: a atirar as suas simples vidas a uma complicada linha?...
**

Unknown disse...

Enlouqueci-me??? " O verdadeiro cadaver não é o corpo, mas aquilo que deixou de viver" Fernando Pessoa. Sei lá se me incomodaria em ser limpa e integra ( verei eu se o eyerline e o restante da maquilhagem condiz com meu ultimo pretinho básico? ) é meio bizarro, sinistro e enquanto vou dando volta e meias com a vida, continuo a existir, a viver e a trabalhar com vidas....
Colocação dificil a ultima.
Aconselho que todos apenas metam-se nos comboios e não se atirem!! melhor que ter idéias suicidas, é ter muitas homicidas..como citei no inicio enlouqueci oficialmente.
beijitos a todos.

Themis (animais sublimes)

PuRpUrInA disse...

Dona Prima,
leve la o tempo gotico pras querluzes, q ca na zona rica da capital so queremos é Solllll!!! lalalala :P

E obrigada pelo comment =D

Ps. Primos, emprestar é errado. Livros, cds, filmes, carros e mulheres, nnca voltam a aparecer ;)

***

A.bruto disse...

Porque isto de ser suicida era um trabalho a tempo inteiro, sem pagamento ou usufruito. Qualquer situação era uma oportunidade para elaborar um plano para um fim, que seria, efectivamente, e se tudo corresse bem, o fim. Quando saiam à rua, viam todos os cruzamentos, ruas de grande circulação, calculavam as médias dos carros, viam as alturas dos edifícios e imaginavam a possíveis lesões no caso de, Deus proíba, sobreviverem.
E, invariavelmente, a melhor solução era essa. Sem esperas, sem hesitações, sem grande margem de erro, era uma morte rápida. E melhor, com hora marcada. Sem atrasos, sem hipóteses de recuo.
E todos eles se riram no momento final, porque não pensaram em Deus, não pensaram nos erros cometido, nas falhas ou nos feitos, na vida ou na morte. Todos eles pensaram que, no fundo, aquele momento se resumia a apanhar um comboio.

odeusdamaquina disse...

"No Comboio descendente vinha tudo à gargalhada, uns por verem rir os outros e outros sem ser por nada.
No comboio descendente, de Queluz à Cruz Quebrada.

No comboio descendente vinham todos à janela, uns calados para os outros e outros a dar-lhes trela.
No comboio descendente, de Cruz Quebrada a Palmela.

No comboio descendente mas que grande reinação, uns dormindo outros sem sono e outros nem sim nem não. No comboio descendente
de Palmela a Portimão"

Cantado por Zeca Afonso
Letra de Fernando Pessoa

Unknown disse...

Essa postagem deu mesmo o que falar e pensar, pq até hj ainda penso!! mas concordo totalmente com A.bruto na questão dos calculos das margens de erro!! vai que é uma morte lenta? ou que não morre?? e o diagnóstico dos "especialistas" é : o paciente "X" apenas queria chamar a atenção e levando em conta, os trajes, a limpeza e tal, o paciente "x" queria atenção em dobro (da familia, dos amigos, da equipa) olha lá Cristina, esse tema é complexo demais.

Themis

Cristina H. disse...

Augusto Bruto,
O que tu escreveste está muito giro e dentro daquilo que seria a continuidade deste, como lhe chamas, textículo.
Será o teu comentário uma provocação para ver se escrevo finalmente qualquer coisa no "verdade na desportiva"? ou será apenas uma 'dica' do quanto as nossas escritas são compatíveis e as nossas almas gémeas? lol
Bem, primeiro, primeirinho, tenho que escrever um texto para o Delirios. Estou em falta com o meu amigo João e chicoteio-me todos os dias por tal facto. Depois, postarei certamente algo no Verdade na Desportiva e, por último, talvez escreva uma carta ao Pai Natal.
Obrigada pelo texto, postai-o num dos teus mil blogues, não o deixes ao abandono nos comentários do Coisas gordas e Más!;)**

___________________________________


Themis,
Em primeiro lugar, agradeço-te o facto de teres enlouquecido oficialmente aqui no meu blogue. Para mim, é uma verdadeira honra!!:)
De facto, a ideia do texto era brincar, por assim dizer, com o conceito de suícida que temos na cabeça: normalmente alguém à beira do colapso, completamente desorientado e, claro está, num estado de desmazelo total. Que, quase por norma, é o oposto do conceito de pessoa de bem com a vida.
Deste modo, quem são os infelizes nesta história, são aqueles que acordam sem motivação e cumprem o dever de estar vivos.
Muito interessante, Themis, é ver que cada um de nós tem a sua própria forma de interpretar o que lê. Os textos que escrevemos, assim que lidos por terceiros, tomam outra forma e outra vida.
Obrigada à Themis e a todos os outros pelas visitas e comentários**

Anônimo disse...

Como será mesmo alguém sentir que não faz cá nada, nem falta a alguém???... Huuuum!!!... Bem, vou ver o "Six Feet Under".